Mães e desempregadas, três mulheres são exemplos de lideranças de ações voltadas para os impactos da Covid-19 entorno de suas comunidades

Elas não são CEOs de grandes empresas como também não lideram países, mas estão à frente de ações dedicadas ao próximo, salvando vidas em um cenário tão catastrófico de crise econômica e sanitária no mundo

Falar com essas três grandes mulheres me acendeu a lanterna – que talvez nunca mais se apegue — do quanto somos sempre capazes de fazer mais, de doar sem nada em troca. Também tocou profundamente minhas emoções e ampliou minha capacidade de admirar e encontrar inspirações sem limites.

Depois de um longo papo por whatasapp, combinei de terminar minha conversa com Vanessa de Oliveira (36 anos e três filhos) por telefone. Muitas vezes uma entrevista começa por escrito e termina na fala. Você quer se aproximar ao máximo do entrevistado e pegar detalhes que a frieza do digital não permite.

Presidente da ONG Kuka Legal, Vanessa relata com a voz que denuncia sua paixão pelo que faz. Sua história em ajudar a comunidade do Flamenguinho, em Osasco (SP), começou em meados de 2007, quando um casal desconhecido acompanhando de uma moradora abordou ela e sua irmã para saber se podiam ajudar no cadastro de 250 crianças para receber roupas, brinquedos e sapatos de natal.

“Nós ficamos muito felizes, fizemos essas inscrições e no mês de Dezembro de 2007 foi realizada a primeira festa da nossa ONG com entrega de roupa, calçado e brinquedo”, conta. É com essa mesma empolgação do começo do trabalho, cujo propósito é ajudar crianças e adolescentes em situações vulneráveis proporcionando ferramentas para o melhor desenvolvimento delas como o esporte, que Vanessa acorda cedo todos os dias para distribuir marmitas e cestas básicas para famílias.

Atualmente, por conta da crise causada pela Covid-19, a ONG está com as atitidades voltadas para essa ação, dominuindo assim o índice da fome em comunidades como a que Vanessa mora.

São em torno de 200 famílias cadastradas e até semana passada haviam sido entregues 70 cestas básicas e 74 kits de produtos de higiene. Além disso, ela e sua equipe distribuem todo dia 300 marmitas doadas pelo Sesi de Osasco para 87 famílias.

“Com as dificuldades que enfrentamos na vida aprendemos a gostar de gente, de cuidar dos outros, de conhecer cada história, e cresceu a vontade de deixar a nossa marca para fazer deste um mundo melhor”, revela num tom emotivo.

E apesar de todas as dificuldades em conseguir apoiadores nessa iniciativa, Vanessa não desiste. Antes de acontecer a pandemia, ela utilizava a quadra de uma escola da região para promover o futebol às crianças integrantes da sua ONG.

Esse mesmo amor ao próximo é o que faz Tatiane Cavalacante, 34 anos, deixar o confinamento na sua casa, depois de cuidar dos oito filhos, para oferecer ao menos uma refeição às cerca de 400 pessoas que moram na comunidade Muinho, em São Paulo. A ação acontece através da parceria entre ONG Novos Sonhos e Bom Prato e a previsão é continuar durante a pandemia.

“Eu amo ajudar, levanto cedo todo dia. Gosto de estar no meio do povo, são experiências que você leva para o resto da vida”, reforça. Cuidar das pessoas sempre foi seu forte – seu trabalho antes de ficar desempregada era numa creche – e durante esses 13 anos que mora no Muinho sempre arranja uma forma de acolher o próximo.

Todo dia às 17h30 ela abre a igreja Assembleia de Deus para receber as pessoas que muitas vezes só terão aquela refeição fornecida naquele espaço. “Quando meus filhos eram pequenos, meu marido tinha problema com drogas e fui ajudada por muitos do meu em torno”, conta Tatiane.

Infelizmente, muitas pessoas que estão em locais demarcados pela pobreza e escassez de coisas básicas sofrem da falta de apoios e acabam tendo relações direta ou indiretamente com as drogas. Assim foi o caso da Marcela Ferreira, de 39 anos e com cinco filhos.

Há oito anos sem usar craque, ela conta que um dos seus papeis quando acolhe mulheres para ter uma condição de sobrevivência, com um lugar para dormir e comer, é mantê-las longe das drogas. “Na minha vida esse trabalho é muito importante porque me lembro que assim como tiveram pessoas me deram as mãos outras também me disseram que eu não tinha mais jeito, e só não existe jeito para a morte”, relata.

Dedicada a tirar pessoas das ruas e a levá-las para espaços desabitados e teoricamente abandonados, Marcela vai dia sim dia não no viaduto Rudge, no Bom Retiro, um dos locais onde acontece uma das ocupações. “Aqui temos até segurança que recebe salário para não deixar entrar estranhos entrar”, conta.

Sobre a rotina no local, ela diz muita alma boa para por ali para deixar cestas básicas e cobertores. No entanto, sempre precisa de comida e produtos de higiene. “A intenção é poder realizar o sonho de cada um conseguir ter um teto. É muito ruim ficar na rua e não ter para onde ir”, revela.

Pois, como ela mesma diz, enquanto houver vida há esperança!

De cima para baixo, Tatiane, Vanessa e Marcela com a família e os filhos
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Mãe resiliente em tempos de pandemia

Imagem Unsplash

Na quarentena existe uma mãe, existe uma mãe na quarentena, e com a maior força do mundo. Ela levanta para arregaçar as mangas mesmo tendo feito hora extra durante a madrugada, organiza a desordem mesmo querendo nela se debruçar, ela se reinventa nas brincadeiras, na comida, na historinha.

É uma mãe que dribla a angústia preocupada em não transferir o sentimento pra filha, limitada entre as paredes sem poder correr feito uma criança livre. Que faz a coisa certa mesmo não tendo certeza o que é a coisa certa. Existe uma mãe que se culpa, mas que também tenta se aceitar, e repetidas vezes se culpa e se aceita.

Ela checa se a porta está trancada pelo menos três vezes no dia com a sensação de que o vírus chegará na casa a qualquer momento. Vence com brio a rotina, cumprindo mil e uma tarefas, mas sempre vai dormir com alguma coisa por fazer. Na quarentena tem uma mãe resistente, mas que derrapa no limbo dos números que entristecem o mundo.

E quando o bem-estar e a felicidade da outra pessoa sob suas asas são colocados em xeque ela resgata suas forças da onde nem sabe de vêm e faz brotar em segundos sorrisos que brilham e abraços que aquecem. Ela até evita acompanhar as notícias antes de encerrar o dia e mesmo assim sente disritmia e é atingida pela insônia. Fica em silêncio, medita, escuta podcast, cozinha, come, faxina, tenta fazer o mínimo de exercício nessa altura do campeonato, lê, assiste desenho.

Se sente perdida, preocupada, angustiada, com medo. E mesmo vivendo os dias mais intensos da sua vida ela sempre vai ter em mente que cair e não se levantar é uma opção nula porque existe uma causa maior que nutre essa força: o amor mais profundo e eterno.

Mãe, desejo que você se lembre da sua capacidade nata de recriar situações, de repensar no almoço, de planejar o dia, de lidar com imprevistos e de pensar no próximo com carinho. Em meio a um momento tenso de transformação, mentalizo que os padrões sejam dissolvidos pelo ralo de uma vez por todas. Assim, que cada uma viva a experiência do maternar à sua maneira.

Mas para isso é preciso se reconhecer no espelho. Então desejo que seja amiga dele, que se ame e se carregue no colo. Lembre-se: se você escolheu ser mãe, não optou por desistir e tampouco deixar de se doar em “tempos de cólera”. Estremeça para se solidificar. Ame para transformar. E já que nossos filhos um dia criarão asas e por isso são outra prova viva de que nada é estático e tudo transmuta, viva esse furacão da impermanência das coisas.

Parabéns a todas as mães que superam seus limites diários com muita coragem nessa fase de tantos turbilhões. Você pode até reconhecer suas falhas, mas não deixe de se abraçar e se perdoar.