Ansiedade, nervosismo e depressão em mulheres na pandemia

Foto de Francesca Zama no Pexels

Fiz uma enquete no insta do madre pra saber qual assunto eu deveria soltar essa semana por aqui, um mais pessoal sobre a maternidade ou um sobre a depressão em mulheres durante a pandemia.

Minha comunidade é só um bocado de gente e tô longe de ter aquele número enfeitando o perfil digno de causar inveja em qualquer um. Por menor que seja essa minha roda, dou ouvidos às minhas parças (e alguns parças) que param pra prestar atenção em mim.

E adivinha qual foi o resultado? Por um ponto, o tema depressão em mulheres ganhou! Não é pra menos. Logo quando iniciou toda essa catástrofe mundial, a Organização Mundial da Saúde (OMS) ressaltou o grande risco das mulheres em apresentar algum sofrimento psicológico associado ao isolamento imposto pela pandemia da Covid-19.

Manter o trabalho remoto, conciliar cuidados com a criança e a casa, fazer toda a rotina acontecer, tocar projetos, resolver as burocracias normais de uma vida e ainda gerenciar os sentimentos de mal-estar gerados por uma crise mundial de saúde é um teste de sobrevivência a qualquer ser humano.

Vamos combinar que esse “novo normal” (aliás, nem gosto desse termo!) é de deixar qualquer um a ponto de surtar?! Mas há um fato impossível de se negar: não é de agora que as mulheres carregam o mundo nas costas.

Segundo dados do IBGE de 2018, antes da pandemia as mulheres já dedicavam o dobro de horas semanais ao trabalho doméstico e/ou cuidado com pessoas comparando com os homens.

E, na atual conjuntura, o trabalho da mulher acabou se intensificando (chato admitir). A pesquisa O trabalho e a vida de mulher na pandemia (acesse aqui), feita pela ONG “Gênero e Número” e pela Organização Feminista “Sempreviva”, concluiu que 50% das mulheres passaram a cuidar de alguém na pandemia.

Fora isso tudo, a ONU Mulheres destacou também que 70% dos trabalhadores sociais e de saúde são representados por mulheres. Este grupo, no caso, além de expor diretamente aos riscos da Covid, quando chega em casa precisa lidar com todo o acúmulo de funções. Ou seja, é exposição ao estresse de tudo quanto é lado.

As pesquisas estão aí para comprovar teorias e deduções. Um estudo coordenado pelo Instituto de Comunicação e Informação em Saúde (Icict/Fiocruz), em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais e a Universidade Estadual de Campinas, (clique aqui para ver), revelou que, as mulheres, das 40 mil pessoas entrevistadas no total, são as que mais relataram problemas no estado de ânimo com mais frequência.

O percentual das que sentem tristes/deprimidas durante a pandemia é de 50%. Já os homens, 30%. Mas não para por aí, nós também nos sentimos mais ansiosas/nervosas com mais frequência do que os homens: são 60% contra 43% respectivamente.

Conversei com a Dra. Valéria Bortolucci, psicóloga e integrante de equipe do ambulatório da UNIFESP, para saber mais como o atual cenário em que estamos vivendo pode afetar a saúde mental e emocional da mulher e como a depressão pode ser detectada e tratada. Fica aqui pra ler meu papo com ela! 🙂

1- Com a sobrecarga de tarefas em casa durante a pandemia, as mulheres estão mais exaustas em todos os sentidos, mental, emocional e físico. Como elas podem trabalhar esta questão para que esse quadro não se torne uma doença como ansiedade ou depressão?
Dra Valéria Bortolucci – É necessário, em primeiro lugar, respeitar os próprios limites e contar, se possível, com o companheiro ou marido na divisão das tarefas. Com acúmulo das atividades como limpeza da casa, acompanhar o estudo dos filhos nas aulas online, muitas vezes tendo que trabalhar em home office, é importante estabelecer uma rotina.

Organizar as tarefas de acordo com as prioridades, com horários certos para refeições e estudo, e, principalmente, estabelecer pausas e intervalos para atividades que deem prazer como caminhadas, exposição ao sol, nem que seja na varanda, ou mesmo brincadeiras com os filhos e as pessoas da casa.

Sono regrado, exercícios físicos, meditação ajudam muito. Recorrer à psicoterapia, quando necessário, tem se mostrado muito eficaz na redução dos índices de estresse e ansiedade, já que podemos contar com o atendimento online neste momento de distanciamento social.

2- Quais são as causas que levam a depressão?
V.B.– As causas são muito complexas. Passam pela alteração de neurotransmissores, cerebrais, uma série de coisas.

Mas as principais delas são: em primeiro lugar genética, quando uma pessoa tem pai, mãe depressivos aumenta a possibilidade em duas vezes de ter um episódio depressivo ou quando tem os avós também cresce essa probabilidade em três vezes.

Outra causa importante são momentos estressores na vida da pessoa, principalmente na infância, como perdas ou negligência dos cuidadores, ou algum abuso físico (violência) ou sexual.

Outros motivos são: uso de álcool ou drogas, sedentarismo e algumas deficiências de vitaminas ou hormônios pode causar isso principalmente nas mulheres. A elevação do cortisol, ou seja, quando a pessoa começa a ficar muito ansiosa, estressada, pode acabar caindo numa depressão também.

3- Como é possível evitar a depressão?
V.B.– Não é possível na maioria dos casos evitar a depressão, até porque as causas são muito complexas. O que ajuda, por exemplo, é a pessoa ter uma vida muito estressante e ser resiliente. Resumindo, a forma como ela encara os desafios da vida.

Mas, de um modo geral, não é possível evitar. No entanto, depois de um diagnóstico e início de tratamento, a pessoa pode conseguir notar quando ela está ficando mais depressiva. Começa com um isolamento, uma tristeza profunda, uma falta de energia, coisas que ela gostava de fazer e passa a não gostar mais.

É importante frisar que a depressão tem graus. Ela pode ser leve, moderada ou grave.

5- Como o tratamento é feito?
V.B.– Quando é uma depressão mais grave, pode entrar com uma medicação associada à psicoterapia. É muito importante praticar exercícios físicos, ler sobre o assunto, estar a par do que é uma depressão.

Outra coisa que é extremamente importante é o acompanhamento familiar no tratamento da pessoa diagnosticada com depressão. As mudanças bruscas de comportamento são muito importantes de serem detectadas. A pessoa precisa falar muito, se sentir acolhida.

6- Como consegue identificar que está entrando em depressão?
V.B – A pessoa com depressão tem a tendência à introspecção, de se fechar no quarto, não querer falar. Ela fica irritável ou apática. Também tem baixa autoestima, sente culpa, uma grande sensibilidade aos eventos negativos e esquece os pontos positivos da vida.

Se tiver algum componente de religiosidade ou espiritualidade também é muito importante. Nem sempre é possível evitar, mas, a partir do momento que a pessoa sabe que está com depressão, aí sim possível driblar as crises. É uma luta que exige muita garra pra sair da situação.

7- No caso da pré-disposição genética é possível identificar na infância?
V.B – Não necessariamente quando a pessoa tem uma pré-disposição genética a gente consegue observar na infância. A coisa pode eclodir mais tarde como também pode acontecer em qualquer momento (infância, adolescência e vida adulta).

Só que a coisa se agrava a partir da adolescência, pois nessa idade existe o risco do suicídio. Na infância, alguns dos sinais são a criança se retrair, se afastar dos amigos, ir mal na escola, ter dificuldade de aprendizagem. E se existir a pré-disposição genética tem que ter mais atenção.

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